Nota del editor: Los siguientes los poemas están disponibles exclusivamente en inglés y portugués. Click aquí para leer en inglés.
O palhaço
faz piruetas ri gargalha
da vida pobre sem graça
desengonçado pula brinca
beija homens-piranhas
fantasia camufla dores
maquiagem borrada
marchinhas bandas gritos
serpentinas na memória
vazio após quatro dias de
felicidade curta e colorida
esboça melancólico sorriso
arranca a gravata e chora
Pensamentos líquidos
gosta de pensamentos
em forma de palavra
escrita ou falada
escorrida na boca macia
entupida nos ouvidos com
a mobilidade do verbo
expulsa discursos enlatados
com uma miserável gotinha
de álcool setenta porcento
filosofias de bar olhares
suspeitos ideologias fora
de validade esquecidas no
fundo dos copos de poetas
malditos pensamentos
líquidos
Poema expresso
peço licença
pra falar um poeminha
do velho cardápio
preciso de homem cigarro
carinho maconha livro e
uma xícara de sexo quente
serve um carioca duplo
encorpado bem forte
fervendo sem adoçante
com uma carreirinha de açúcar
pra viagem dose de poeta
por favor
Lyrics
descobri um risco
no disco percebi
sua culpa
mas foi melhor
disfarçar pensei
quieto calado
aguentando ataques
dores marcando
a pele por dias e dias
chorei me humilhei
por um poquinho
de amor
nada
só arranhões
faltava harmonia
a música no mesmo
verso cansando
cansando cansando
até quebrar agulha
e eu? sem coragem
de mexer na eletrola
à espera
de um inútil reparo
concerto
sem força
pra cantar gritei
seu nome
velha melodia
Como eliminar monstros & demônios
para Ronaldo Serruya e Fabiano de Freitas
repita a você mesmo:
eu não sou um vírus
vamos repita:
eu não sou um
vírus
digo aos outros que sou louco para que as pessoas que tem medo de gente louca não
se aproximem de mim
me disse o leão
tenho adotado o mesmo método
para viver com hiv
promíscuo pervertido viado
coleciono os rótulos e jogo fora junto com as bulas de letras miúdas
que enchem as gavetas do armário
ao menos tenho conseguido entender
quem sou em meio a contagem de cd4 e quantidade de vírus no meu sangue
para classificarem como quiserem
indetectável
posso transar sem camisinha que não infecto ninguém
afirmam os médicos
infectar não contaminar, reaprendi a falar
assim como não se deve pronunciar aidético
palavra embolorada de estigmas
minha língua
gem está infectada pelo hiv-aids
não é a língua, é o cu! – berra copi pela boca de carrera
com sua dificuldade de se expressar e ainda reverbera em meus ouvidos
é o cu!
músculo de veludo cantado por piva
promessa-derradeira-entrada-franca-dos-demônios
tenho eliminado monstros &
demônios
a cada dia
com reza brava
coloquei meus preconceitos no altar
olhei para eles rezei
para depois xingar um por um
por três anos aos prantos
até conseguir vomitá-los em ritos xamânicos
me olhei por fora embora por dentro
cheio de medo
me transformando em bichos
uma onça que lambe as próprias feridas
ou uma cobra de várias cabeças
apresentando a cura
enquanto participava do meu velório
sem choro nem vela
e prometia a guarda da biblioteca para o marona
quantas mortes nessa epidemia discursiva?
40 milhões de mortes em todo mundo
dionísio disfarçado de mendigo dançou comigo uma poesia cósmica e sem nome
eu cortava meus medos com golpes no pescoço
e decepava
pedaços do meu desejo de apontar
culpados
doloteglavir sódico + fumerato de tenofovir + lamivudina
caio + leonilson + cazuza (melhor assim)
ao meio-dia de estômago vazio
contando o tempo em comprimidos
meu corpo se entope de toxina
ainda contamos os mortos
mesmo sorrindo
tentando acreditar na cronicidade dos dias
reinventando narrativas
passeando entre o medo incendiário
de al berto
os cantos de ilusão de perlongher
e a linguagem viral de burroughs
em noites de insônia
marítima
“O palhaço”, “Pensamentos líquidos”, “Poema expresso”, e “Lyrics” do livro Vinis mofados (2009)
“Como eliminar monstros & demônios” do próximo livro A porta de trás do paraíso